21 Julho 2021
Com fama de empreendedor genial, o homem mais rico do mundo mandou R$ 5 bilhões para o espaço em plena pandemia.
A reportagem é de Murilo Pajolla, publicada por Brasil de Fato, 20-07-2021.
No clássico do cinema Blade Runner, o Caçador de Androides (Ridley Scott, 1982), somos apresentados a um futuro distópico, em que milionários foram viver em colônias espaciais paradisíacas, deixando para trás uma Terra em colapso socioambiental.
Se é verdade que a vida imita a arte, as recentes aventuras pela órbita terrestre do homem mais rico do planeta, Jeff Bezos, mostram que esse cenário dramático está mais próximo do que se poderia imaginar.
Enquanto o mundo amarga uma crise econômica e sanitária sem precedentes, o fundador da Amazon decidiu construir uma nave para dar uma “voltinha” na borda da terra que durou, ao todo, 10 minutos.
Nesta terça-feira (20), o foguete sem piloto produzido pela sua empresa de turismo espacial, a Blue Origin, decolou e trouxe de volta, em segurança, a tripulação.
O projeto custou uma "pequena" fortuna: US$ 1 bilhão (R$ 5,2 bilhões). Embora alta, a despesa nem arranha seu patrimônio, estimado em US$ 202,7 bilhões (R$ 1,05 trilhão).
O excêntrico milionário tem fama de self-made man, expressão cunhada pelos norte-americanos para designar o empreendedor que trilhou o próprio caminho até o sucesso.
Se “por detrás de uma grande fortuna há um crime”, como escreveu o francês Honoré de Balzac, a trajetória de Bezos está marcada pela superexploração da mão de obra, manobras fiscais para não pagar impostos e práticas antissindicais.
Enteado de um funcionário da multinacional de petróleo e gás Exxon, Bezos cursou Engenharia Elétrica e Ciência da Computação na Universidade de Princeton, uma das mais prestigiadas e caras do país.
Formado, trabalhou no setor financeiro em Wall Street, mas decidiu abrir uma loja virtual. A criação da empresa que se tornaria a gigante Amazon contou com capital inicial de US$ 245 mil vindo do bolso dos pais do empreendedor.
A Amazon começou como uma empresa de vendas e entregas e hoje oferece streaming de música e vídeo, produção própria de cinema e televisão, produção de eletrônicos e inteligência artificial. É a marca mais valiosa do mundo, avaliada em mais de US$ 1,5 trilhão (R$ 7,85 trilhões).
Se quisesse poupar uma cifra como essa, um brasileiro ganhando salário mínimo teria que trabalhar durante 185 mil anos, sem gastar nada.
Além da Amazon e da Blue Origin, Bezos também é dono do jornal Washington Post, adquirido em 2013 por US$ 250 milhões em dinheiro, que celebrou com destaque nesta terça-feira (20) o feito espacial de seu proprietário.
A Amazon é acusada de praticar dumping, que significa chegar em um país e vender os produtos a preços muito abaixo dos praticados no mercado, com objetivo de "quebrar" a concorrência local.
A prática vem condenando o mercado editorial brasileiro ao declínio, com o fechamento de livrarias. Por isso, a França chegou a aprovar em 2013 uma lei contra a Amazon para proteger a economia nacional.
A sonegação de impostos através de manobras legais é outro fator que explica o sucesso da marca. A ProPublica, agência de jornalismo norte-americana, revelou um esquema dos bilionários para se evadir do fisco. Segundo a reportagem, Bezos não pagou um centavo em impostos federais nos anos de 2007 e 2011.
Os preços baixos são consequência direta dos péssimos salários. A Amazon é apontada como uma fábrica de exploração e acusada de violar leis trabalhistas. Em 2014, Bezos ganhou o “prêmio” de “Pior Chefe do Mundo” da Confederação Sindical Internacional.
Embora tenha cerca de 800 mil funcionários, não existe sequer um sindicato de trabalhadores da Amazon. Segundo o site Intercept, o patrão chegou a contratar um “consultor anti-sindical” com o objetivo de impedir a criação da primeira organização no estado do Alabama.
Enquanto isso, acumulam-se denúncias de más condições de trabalho. Os relatos incluem a negativa de pausas para o almoço e a ordem de urinar em garrafas para atender as pesadas demandas de atendimento.
O site The Verge, dos Estados Unidos, denunciou que a Amazon usa um software que rastreia a produtividade e usa os dados para demitir funcionários. Ela teria demitido centenas de pessoas entre 2017 e 2018 por não ter cumprido metas, que incluem embalar centenas de pacotes por hora, por exemplo.
Em outro caso, funcionários denunciaram a falta de protocolos sanitários durante a pandemia, e o resultado foi a demissão. A empresa também já ameaçou demitir trabalhadores que são contra as políticas ambientais da Amazon.
Ainda jovem, o bilionário afirmou que “gostaria de retirar todas as pessoas da Terra e transformá-la em um grande parque nacional”. O discurso foi feito na formatura do colégio, que teve Bezos como orador, segundo uma reportagem do Infomoney.
Hoje, a fome atinge pelo menos 10% da população mundial, aponta a Organização das Nações Unidas (ONU). No Brasil, assistimos à erradicação da floresta que dá nome à gigante multinacional.
Enquanto brinca de perseguir sua utopia juvenil, Bezos contribui para transformar o planeta em um ambiente inóspito, onde só os milionários têm salvação.
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Superexploração e impostos zerados: quem é Jeff Bezos, o bilionário que foi passear no espaço - Instituto Humanitas Unisinos - IHU